Cidade Selvagens –

Como criar uma vida urbana positiva neste momento de transição

Por Natália Fontes Garcia


Bem, já que estamos aqui no blog da Bambual Editora, que é especializada em livros sobre a regeneração global, creio que podemos falar claramente, não é? Pois comecemos então a conversa pelo fato de que estamos bastante encrencados. Há ensaios e mais ensaios sobre um novo campo do conhecimento chamado “colapsologia”, que se dedicam a estudar o tamanho do colapso sistêmico que já está chacoalhando nossas vidas e tende a piorar bastante. Ao mesmo tempo que há também muito conhecimento sendo produzido sobre a “utopia do selvagem”, um retorno à conexão com a vida pulsante e biodiversa que ainda vibra fora dos grandes centros urbanos. O que nos leva a olhar para algo que me parece bastante urgente: a lógica de como vivemos em cidades. Porque vejo que este é o ponto nevrálgico da transição que cada um de nós precisa vivenciar para termos alguma chance de sobreviver como espécie humana. 

Bem, cheguei falando já destas coisas profundas e avassaladoras sem nem antes me apresentar, desculpe, é que todo este movimento global tem mexido bastante comigo, como acredito que com você também. Então, deixe eu te contar um pouquinho sobre mim. Sou Natália Fontes Garcia, jornalista, escritora e autora aqui da Bambual, onde publiquei Sete Dias No Butão – O que aprendi sobre felicidade. Nos últimos 15 anos, eu tenho me dedicado a estudar como as cidades podem ser territórios que estejam a nosso favor, e não contra nós.

Como assim contra nós?

Explico com dois fatos. O primeiro é que as principais causas de morte humana neste planeta –doenças cardiovasculares, complicações respiratórias, câncer, acidentes de trânsito e até mesmo a pandemia – estão diretamente ligadas à forma como vivemos em cidades. Trânsito, poluição do ar e dos rios, estilo de vida estressante, relações de obsessão com o trabalho, vícios, sedentarismo, falta de espaços de lazer e mau uso do tempo são elementos presentes nas vidas de muitos de nós, urbanos, e isto faz das cidades um ambiente que, no mais profundo, nos desconecta da vida. O segundo fato é que este estilo de vida urbana é justamente o que nos trouxe até a “colapsologia”, pois é na cidade que se estabelecem todos esses sistemas – político, educacional, social, financeiro, entre outros – se estabelecem. 

E como saímos desta encrenca? 

Até onde eu posso ver, e de tudo o que já pude pesquisar, a saída tem relação com a “utopia do selvagem”. Sim, você leu corretamente, eu estou aqui propondo que a transição que precisa acontecer nas cidades para que elas passem a ser ambientes que conectem com a vida (e não o contrário, como tem sido nos últimos séculos) passa pela recuperação do selvagem. E vejo isso em dois níveis. 

O primeiro e mais óbvio é o ambiental. Ao longo do tempo, à medida que nossas cidades se desenvolviam, fomos concretando e impermeabilizando o chão, canalizando os rios, extinguindo a mata, acumulando resíduos e isso provocou coisas que eram inimagináveis. Por exemplo: São Paulo, que no começo do século XX era conhecida como “terra da garoa”, uma das cidades com mais rios e riachos no mundo, foi drenando sua água até se transformar em um deserto – literalmente, há dias em que a umidade relativa do ar no centro da cidade é menor do que a do deserto do Atacama. A única solução possível é trazer um pouco dessa mata de volta, voltar a permeabilizar o chão, deixando água voltar a circular e escoar para os lençóis freáticos, amenizando a temperatura, voltando a umidificar o ar, trazendo um equilíbrio sistêmico de volta para o clima. 

Mas há algo que nos impede de fazer essa mudança. Você tem alguma ideia do que seja? Políticos? O mercado imobiliário? A crise? A desigualdade social? Sem dúvida que esses fatores interferem, mas há algo mais profundo por trás disso tudo: os nossos hábitos. Aquilo que nos habituamos a considerar normal. Pode parecer que estou exagerando, mas não, os hábitos realmente têm um poder enorme sobre a realidade que criamos. Um hábito é um comportamento que foi repetido um número suficiente de vezes para se tornar automático. São todas aquelas ações que fazemos e pensamentos que passam por nós em nosso dia a dia sem nem pensarmos a respeito – e às vezes sem nem nos darmos conta. Segundo o livro Hábitos Atômicos, cerca de 60% do nosso tempo acordado é vivido neste “piloto automático” dos hábitos. E um importante alicerce da vida urbana está justamente nos hábitos. 

E é aí que está o segundo aspecto do retorno ao selvagem, ou seja, a uma forma de viver em que possamos ser mais espontâneos, tenhamos mais conexão com os ciclos das estações e dos alimentos, que nos afinemos com esses ciclos em nosso trabalho e em nossa rotina. Estou falando de viver uma vida urbana positiva – e da importância de reformar os nossos hábitos para fazer isso. Esta transformação ambiental das cidades começa com uma transformação de paradigma dentro de nós. Pelo menos foi isto o que pude notar nas mais de 100 cidades que investiguei ao longo de dez anos com o projeto Cidades para Pessoas – cidades melhores começam com pessoas vivendo melhor.  

O termo “Wild Cities”, ou Cidades Selvagens, tem aparecido cada vez mais em seminários globais do urbanismo e fala justamente por recuperar esses dois aspectos: a relação com a biodiversidade no ambiente urbano e o aumento do bem estar e da qualidade de vida para que as pessoas possam ser mais espontâneas, o que se reflete em cidades mais harmônicas. 

Mas, por onde começar?

Vou te dar uma dica. Olhe para a sua vida urbana. Escolha algumas dimensões da vida para você examinar (eu sugiro: trabalho, saúde, rotina e uso do seu tempo). Examine como você está em cada uma dessas dimensões e o que gostaria que fosse diferente. Examine também o que te impede de fazer diferente, conheça os seus “não” para você mesmo. Então, olhe para os seus hábitos. Veja quais deles fortalecem a vida urbana que você quer levar e quais te atrapalham. Então, escolha um novo hábito que possam te aproximar dessa vida urbana que você almeja.

Por exemplo: quero dividir melhor meu tempo, então sempre que terminar de trabalhar eu vou desligar meu computador para me dedicar a outras áreas da vida. Ou: quero ter mais disposição pela manhã, então vou começar meus dias tomando um copo d’água. Ou ainda: quero começar a correr, então vou dar uma volta no quarteirão todo dia depois do almoço. 

Nota que nesses exemplos eu estou sempre estabelecendo em que momentos o novo hábito será feito e sempre atrelando ele a um hábito já existente – isso é bem importante para realmente conseguir colocar em prática. E note também que estou propondo coisas bem fáceis de fazer (tipo tomar um copo d’água pela manhã) porque é isto que faz com que tenhamos a firmeza de realizar a ação todos os dias até que se torne um hábito, o fato de ser algo muito fácil. Com o tempo, você vai aprimorando esses novos hábitos e, então, vai poder ir soltando os mais hábitos que já não te servem mais. 

Se quiser comentar logo abaixo quais os hábitos que decidiu implementar, vou adorar saber!

E, caso você sinta um chamado de se aprofundar nesta construção de uma vida urbana positiva (para melhorar sua própria vida e para ter ferramentas para melhorar sua cidade através dos seus projetos), tenho um convite para te fazer! A partir da semana que vem, vou iniciar a jornada A Cidade em Transição, uma série de oito encontros online e ao vivo comigo, em que faremos um mergulho sobre: sua percepção (aquilo que você apreende do seu entorno), seu paradigma (o que você entende daquilo que apreende) e seus hábitos (a sua forma de agir, e a relação que ela tem com essa percepção e esse paradigma). A ideia é que você tenha elementos suficientes construir uma vida urbana positiva e para trabalhar para que mais pessoas possam viver essa transição. Você pode saber mais sobre este assunto aqui: https://www.anovacidade.com/.

E, já que você me leu até agora, te ofereço 20% de desconto na jornada, é só utilizar o código Bambual. Vou adorar te receber lá! E para conhecer mais do meu trabalho, me siga no instagram @nataliagarcia.lampejo.

Até logo e cuide-se!